segunda-feira, 14 de julho de 2008

Governo e professores: os únicos vilões da Educação no Brasil?

Armando Terribili Filho
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Muito se fala sobre a importância da educação na formação de um povo, de um país, no seu desenvolvimento, crescimento e, sobretudo, a respeito das conseqüências na melhoria da qualidade de vida da população. Formação de um povo que envolve não apenas a qualificação técnico-profissional, mas a cultural, ética e cidadã. Indicadores da educação brasileira têm evidenciado que, nas últimas décadas, atribuímos prioridade aos aspectos quantitativos em detrimento da qualidade do ensino, seja o fundamental, médio ou superior.Falar em educação como prioridade nacional virou lugar-comum em palanques políticos, discursos politicamente corretos, opinião de intelectuais, sindicalistas e empresários. Entretanto, quando se procura identificar os responsáveis pelas ações de curto, médio e longo prazos para reverter esse quadro, todos os caminhos convergem ao governo.
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Nesse contexto, as discussões tornam-se tendenciosas, parciais, coloridas e com bandeiras partidárias, uma vez que tratam de defender os feitos e desfeitos dos representantes dos partidos políticos envolvidos. Um segundo grupo de prováveis “culpados” é o de professores. Ouvimos contínuas críticas a essa classe, o que invariavelmente também é resultado do modelo de educação vigente no País, que recebe formação deficiente e, em certos casos, precária. Como agravante a um desempenho profissional aquém das expectativas há, muitas vezes, condições de trabalho inadequadas e a própria questão da baixa remuneração. Há ainda outros grupos com potencial parcela de culpa na baixa qualidade da educação brasileira, nas áreas pública e privada: as instituições de ensino e seus administradores, os secretários de educação em nível municipal e estadual, e os elaboradores de políticas públicas, entre outros.
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Tese de doutorado defendida recentemente pelo autor deste artigo evidencia que o estudante do ensino superior no período noturno (60,9% do total de 4,6 milhões de brasileiros) enfrenta no seu dia-a-dia dificuldades relacionadas ao trânsito, meios de transporte e atividade profissional depois do expediente normal de trabalho, que impactam sua chegada à instituição de ensino, ocasionando atrasos e faltas, perda de aulas e provas, e comprometendo sua construção de saberes e fazeres.A legislação trabalhista, por seu turno, é omissa e não contempla nenhum tipo de facilidade para o estudante do ensino superior noturno. Também não há na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) flexibilização de horário para o estudante-trabalhador, permitindo sua saída mais cedo do trabalho, assim como sua locomoção e alimentação antes do início das aulas.
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Na tese mencionada, foram entrevistados 380 estudantes de três cidades paulistas. Na Capital, 19% dos pesquisados chegam atrasados todos os dias na instituição de ensino, em função da realização de atividades profissionais após o expediente normal de trabalho, e 31% se atrasam pelo menos uma vez por semana pela mesma razão. No interior, a situação não é muito diferente, com 14% e 11%, respectivamente. Os estudantes-trabalhadores do comércio são os que mais se ressentem com a inflexibilidade do horário de trabalho, pois sua saída é por volta das 19h, conflitando com o início das aulas.
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Outra queixa dos estudantes-trabalhadores: como a maioria se locomove diretamente do local de trabalho para a instituição de ensino, a alimentação antes das aulas se resume a um rápido lanche – isso quando possível. Na cidade de São Paulo, 91% dos estão nessa situação; no interior, o índice é de 19%.
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Sem nenhuma conotação protecionista, deveria ser analisada uma alternativa para a flexibilização do horário de trabalho, sobretudo no final do expediente, para que o estudante tivesse o tempo necessário para sua locomoção até a instituição de ensino, além de poder alimentar-se adequadamente. Outro aspecto a ser avaliado seria a ampliação do valor do benefício-alimentação, contribuindo para que o estudante pudesse fazer uma segunda refeição diária antes das aulas. Para isso, as empresas poderiam receber algum tipo de incentivo do governo federal quanto à redução de tributos. Ambas as concessões seriam aplicáveis exclusivamente em meses letivos e teriam baixo impacto financeiro para as organizações.
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Retornando ao início deste artigo, torna-se oportuno reverter a qualificação de “prováveis culpados” acerca da situação da educação no Brasil para “agentes solucionadores”. E no caso apresentado sobre atrasos e faltas de estudantes em função de horário de saída do trabalho, cabe aos legisladores, empresários e gerentes darem sua contribuição à educação. Se, por um lado, o compromisso da Educação é com a sociedade, por outro, a sociedade também tem compromisso com a Educação e sua qualidade. Dessa forma, todos somos co-responsáveis pela Educação no País.
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